teste

Olá estou formulando uma enquete para saber quais tipos de assuntos e dicas para assim melhorar nossa comunicação , pesso por gentileza que mandem um email para .......andreexploid09@gmail.com.......

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

As Origens do terrorismo....

 
O terrorismo é o grande assunto do momento. Ele afetou as bolsas de valores e as perspectivas de crescimento das economias, a começar pela norte-americana -- a mais poderosa do globo -- e vem suscitanto uma série de discussões sobre como evitá-lo, com algumas propostas que, se adotadas, vão certamente alterar algumas de nossas rotinas do dia a dia. E também a ordenação geopolítica mundial começa a sofrer significativas modificações em função do desenrolar dos acontecimentos, em especial da luta contra o terrorismo. Tudo começou, como se sabe, com os recentes atentados do dia 11 de setembro deste ano, que destruíram as duas torres do World Trade Center, em Nova Iorque, e parte das instalações do Pentágono, em Washington. A reação norte-americana, ao contrário do que temiam alguns -- e do que sugeriam as primeiras declarações atabalhoadas do Presidente George W. Bush --, foi relativamente cautelosa na medida em que essa superpotência militar procurou, antes de iniciar uma contra-ofensiva, cimentar toda uma aliança internacional de apoio. Quase um mês após os atentados, as forças armadas estadunidenses -- com o aval da ONU e com a colaboração ativa (envio de tropas) ou passiva (apoio logístico) de inúmeros outros países -- iniciaram uma série de fortes bombardeios sobre o Afeganistão, país onde se localizam o quartel general e vários campos de treinamento do grupo terrorista El Quaeda [A base], liderado pelo milionário saudita Osama Bin Laden, considerado pelas organizações de inteligência dos Estados Unidos, do Reino Unido e de outros Estados como o responsável pelo planejamento daqueles atos destrutivos. Bin Laden nega qualquer envolvimento naqueles atentados -- algo, por sinal, coerente com o posicionamento do terrorismo atual ou pós-moderno, que quase nunca assume a autoria de suas ações --, mas o seu envolvimento com o terrorismo é patente (algo que ele próprio admite, inclusive as ameaças que fez contra os Estados Unidos no início deste ano, prometendo uma onda de atentados caso o novo governo desse país continuasse com a sua política de abandonar os palestinos e deixar Israel à vontade) e ele já foi exaustivamente apontado como o responsável por alguns outros violentos atentados ocorridos anteriormente.
O objetivo destes comentários é analisar o que é o terrorismo atual ou pós-moderno e realizar algumas inferências a respeito do seu significado na nova ordem mundial, que mais uma vez se redefine neste momento. Não pretendemos analisar exaustivamente este episódio específico -- os atentados de 11 de setembro e a reação norte-americana --, que por sinal ainda não chegou ao seu término (nem mesmo no que diz respeito ao futuro do Afeganistão). Provavelmente o governo deste país vai mudar, com a saída do Teleban e a entrada de uma coalisão formada pela Liga do Norte e por representantes do antigo rei, do Paquistão, do Irã (afinal 20% da população afegã é constituída por muçulmanos xiitas, que foram fortemente reprimidos no governo do Teleban; e o apoio iraniano é fundamental para amenizar os protestos islâmicos) e talvez até da facção moderada do Teleban, que nestes últimos dias vem procurando se distanciar do terrorismo e passou a denunciar o "exagerado poder" do El Quaeda no Estado afegão. Mas isso não é o fundamental -- e nem mesmo o futuro de Bin Laden e do seu grupo terrorista (que provavelmente vai continuar mesmo sem ele). O essencial são as mudanças permanentes que todo esse episódio deverá ocasionar nas relações (econômicas, político-diplomáticas e militares) internacionais. O terrorismo -- que constitui verdadeiras redes (CASTELLS, 2001) e não se resume a este grupo referido -- passou a ocupar o antigo papel do "comunismo", o de "inimigo" ou ameaça maior à continuidade do sistema global. Qualquer que seja o desfecho deste episódio específico, a luta do e contra o terrorismo, infelizmente, deverá prosseguir por anos ou talvez até décadas. E, mais uma vez (pois isso já ocorreu anteriormente, em outros momentos nos quais ocorreram sucessivos atentados ou "ondas" terroristas), o movimento terrorista deverá produzir um efeito contrário ao que almeja: ao invés de desestabilizar as instituições dominantes (em especial o Estado), as fortalecerá; ao invés de gerar mais pânico, insegurança e desestruturação social (algo que de fato produz, a curto prazo), ele deverá a médio e a longo prazo fortalecer e até legitimar novas e mais severas medidas de segurança e de vigilância sobre a vida cotidiana das pessoas em geral.

2. O que é o terrorismo pós-moderno?

O terrorismo é uma forma violenta de protesto (e de tentativa de desestabilizar algum regime) conhecida desde a antiguidade. Existem referências a atos terroristas desde a Grécia antiga, passando pelo Império Romano e por inúmeros outros momentos da história. Uma primeira e intensa "onda terrorista" ocorreu no final do século XIX e inícios do XX. Naquele momento ninguém se sentia seguro e a salvo do terrorismo, confome relata um estudioso do assunto, Walter LAQUEUR (1996). Em 1894 um anarquista italiano assassinou o Presidente francês Sai Carnot; em 1897 anarquistas mataram a punhaladas a imperatriz Elizabeth da Áustria e assassinaram o Primeiro-Ministro espanhol Antonio Canovas; em 1900 o rei Humberto I, da Itália, foi vítima de outro ataque terrorista e, no ano seguinte, um anarquista matou o Presidente norte-americano William McKinley. E não podemos nos esquecer que a Primeira Guerra Mundial foi deflagrada após o assassinato, em 1914, de um arquiduque austríaco por um terrorista sérvio. O terrorismo, assim, é uma ação desesperada e violenta, feita por grupos (ou eventualmente por um indivíduo) que almejam mudar alguma coisa na vida política e social -- derrubar um regime, lutar contra uma potência colonialista ou imperialista, alterar radicalmente os valores de uma sociedade, alcançar uma independência nacional -- e ele costuma ser diferenciado da guerra (choque entre Estados) e da guerrilha (na qual um grupo almeja controlar um território). A principal finalidade dos atos terroristas é semear o pânico, desestabilizar as instituições e com isso suscitar mudanças radicais. Talvez estejamos vivendo uma segunda "onda terrorista" neste momento, pois existem centenas de grupos terroristas no mundo e os atentados, ao que parece, estão ficando mais freqüêntes.
Mas o terrorismo atual -- chamado de pós-moderno ou de global -- é diferente das formas anteriores. E os atentados terroristas do dia 11 de setembro último, ao contrário do que escreveu CHALLIAND (2001), simbolizam muito bem este "novo terrorismo", em especial pelo planejamento e pelos objetivos, pela natureza globalizada e pelo uso inteligente da mídia. O "velho terrorismo", em especial aquele do final do século XIX e inícios do XX, era formado por organizações anarquistas ou nacionalistas que tinham propostas políticas bem definidas e em geral assumiam os seus atos. Elas inclusive tinham orgulho de suas ações -- normalmente assassinatos de autoridades do regime que combatiam -- e acreditavam que uma boa parcela da população os apoiava. Já o "novo terrorismo", o pós-moderno ou global, não tem um objetivo político preciso e normalmente as organizações que o praticam não fazem muita questão de assumir a autoria de inúmeros atos terroristas (LESSER, 2001), embora ocasionalmente o façam após uma premeditada demora. O "velho terrorismo" procurava eliminar figuras estratégicas do regime que combatia, evitando atingir inocentes. Já para o "novo terrorismo" não há inocentes, todos devem sofrer as consequências dos atos do regime sob o qual vivem e eventualmente apoiam. (Nem mesmo as populações que em tese seriam "libertadas" ou "esclarecidas" pelos terroristas são afinal inocentes que devem ser poupados, pois na lógica de sua argumentação existe a idéia de que "quem morre pela causa" deve se sentir realizado). Além disso, a destruição de edifícios símbolos (como as torres do WTC ou o Pentágono, dentre outros) e a matança de centenas ou milhares de pessoas é algo que chama a atenção da mídia e justamente esta é uma das grandes preocupações do terrorismo pós-moderno. Ele busca a cobertura por parte da mídia internacional, suas ações só têm sentido no contexto de sociedades democráticas onde a mídia em geral e em especial a televisão (que transmite imagens e sons e influencia uma parcela maior da população) é mais ou menos livre e procura dar uma cobertura imediata aos acontecimentos considerados "quentes" ou de grande importância. Podemos até dizer que existe uma relação simbiótica entre o "novo terrorismo" e a "nova mídia": ambos são globalizados e visam a opinião pública internacional (que logicamente é mais intensa e influente nos países desenvolvidos), sem a qual não existiriam; ambos preocupam-se com o sensacionalismo, com acontecimentos trágicos que têm que ser (re)produzidos constantemente para prender a atenção do público (como se sabe, "dá muito mais ibope" uma notícia sobre uma chacina do que uma outra sobre o avanço da unificação européia ou sobre o perdão da dívida externa de alguns países pobres). Basta atentar para o fato de que, nos dias e semanas que se seguiram aos recentes atentados terroristas nos Estados Unidos, algumas redes de televisão alcançaram altíssimos e atípicos índices de audiência (algo que permite cobrar mais pelo minuto de propaganda e conseqüentemente amplia os lucros), em visível contraste com os preços das ações das empresas em geral (principalmente das companhias aéreas e de seguros), que cairam bastante nesse período.
O terrorismo de inspiração anarquista, intenso no final do século XIX e no início do XX, praticamente não existe mais. Uma possível exceção seria a figura isolada do Unabomber, terrorista que agiu durante cerca de 18 anos nos Estados Unidos e foi capturado em 1996. Mas mesmo ele pouco se identifica com o anarquismo clássico (a não ser talvez com o individualismo de inspiração stirneriana), pois este não é contra o progresso (a eletricidade, as máquinas, a tecnologia moderna) e sim contra o Estado e as desigualdades sociais. E os anarquistas atuais -- ou neoanarquistas --, por sua vez, preferem as manifestações de massas, sejam pacíficas ou até violentas, as quais também se apóiam na mídia internacional e fazem amplo uso da internet, tais como aquelas rotuladas equivocadamente como antiglobalização: Seattle, Toronto, Genebra, Praga, Davos, Porto Alegre, Gênova, etc. Mas eles não são cúmplices nem simpatizantes do "novo terrorismo", pois este prejudica a sua causa ao confundir protestos com matanças indiscriminadas e ao contribuir para a legitimação de novas e mais severas medidas de segurança e de repressão por parte dos aparatos estatais. Já o terrorismo de cunho nacionalista ainda sobrevive e é importante em algumas regiões do mundo, em especial na Espanha -- o ETA -- e na Irlanda do Norte (com reflexos na Inglaterra) -- o IRA. Mas a princípio ele não é global(1) e sim circunscrito à região (ou nação) que pretende libertar e à(s) outra(s) que a domina(m). E ele também não mata civis de forma indiscriminada, pois uma de suas maiores preocupações é obter o apoio da opinião pública para a sua causa(2).
As principais modalidades do terrorismo pós-moderno são as seitas ou organizações fundamentalistas, apocalípticas e tradicionalistas (LIFTON, 1999; FLYNN, 2000; LAQUEUR, 1996). Essa é mais uma diferença essencial entre ele e o "velho terrorismo". Este último -- em especial o terrorismo anarquista -- era de "esquerda" (e se considerava como "progressista") no sentido de lutar por uma maior igualdade social, de se opor violentamente não ao progresso em si, mas sim ao seu usufruto por somente uma minoria da população. Já o terrorismo pós-moderno é essencialmente conservador e, ao contrário do que muitos pensam, é radicalmente contrário aos ideais de igualdade e liberdade para todos. A bem da verdade, normalmente ele combate esses ideais democráticos, taxando-os de "ocidentais" (num sentido pejorativo) ou então de"artificiais" e "anti-naturais". Ele não está nem um pouco preocupado com as desigualdades internacionais ou com a pobreza ou a exclusão de inúmeros povos e sim com a ameaça a certos valores tradicionais (religiosos ou não) que considera absolutos: por exemplo, a superioridade masculina e outros princípios do Islão, a superioridade do homem branco anglo-saxônico e protestante (no caso de Timothy MacVeigh, o terrorista de Oklahoma, que praticou o maior atentado terrorista já visto nos EUA até o dia 11 de setembro último), a destruição da ordem atual das coisas com vistas à construção de um mundo novo alicerçado em determinadas crenças religiosas (no caso da seita apocalíptica japonesa Aum Shinrikyo, que há alguns anos espalhou o gás sarim no metrô de Tóquio) etc. Sem dúvida que a situação precária dos palestinos, que piorou muito com os novos governos de Israel (Sharon) e dos Estados Unidos (Bush), serviu como motivo mais imediato destes recentes atos terroristas nos EUA, que foram praticados por grupos (uma verdadeira rede) extremistas islâmicos. Mas confundir isso com um protesto furioso contra a globalização ou contra as exclusões e desigualdades em geral, como fizeram muitos recentemente, é não entender nada sobre tais grupos terroristas e as suas motivações.
Uma outro traço característico do terrorismo pós-moderno é que ele não se limita a assassinatos ou explosões isoladas, que eram as tônicas no "velho terrorismo". Ele é global -- ele convive com e se alimenta da globalização -- e dispõe de todo um sofisticado arsenal de financiamento e de artefatos: novos meios de destruição (químicos, biológicos, tecnológicos), contas bancárias numeradas na Suiça ou em "paraísos fiscais" e membros recrutados em vários países (e treinados em outros), alguns inclusive com um nível educacional elevado (pós-graduação ou até doutorado em microbiologia, química, eletrônica, sistemas de redes etc.). Ele é financiado tanto por contribuições dos membros e principalmente dos simpatizantes -- muitos dos quais arquimilionários, pessoas muito bem inseridas no sistema global e que reconditamente combatem a atual supremacia de determinados valores que detestam -- como também em alguns casos pela associação com o tráfico de drogas. Ele dispõe do indispensável apoio de alguns Estados que os escondem ou até que permitem (ou financiam em parte) os seus campos de treinamento: como se sabe, nos anos recentes esse papel foi desempenhado, em maior ou menor proporção, pelo Sudão, pela Somália, pela Líbia, pela Síria, pelo Iraque e pelo Afeganistão. E o terrorismo pós-moderno dispõe de novos e mais potentes instrumentos de ação: não somente os assassinatos e as explosões, mas também gases nocivos (como o sarim), agentes biológicos patogênicos (como o antraz) e talvez até, desde que exista a ajuda de algum Estado com essa tecnologia, material radioativo e no limite armamentos atômicos. Devido à grande sofisticação dos atuais meios de destruição, que mais cedo ou mais tarde acabam ficando à disposição de grupos que têm recursos para adquirí-los, o terrorismo torna-se, pelo menos potencialmente, cada vez mais letal ou até catastrófico (CARTER, DEUTCH e ZELIKOW, 1998).

3. As redefinições na ordenação geopolítica mundial

Ao que tudo indica, as conseqüências dos atos terroristas do dia 11 de setembro serão variadas e permanentes. Os bombardeios sobre o Afeganistão e a provável troca de seu regime político constituem apenas uma pequena amostra delas. Um novo sistema de alianças deverá ser construído a partir desse episódio. É algo que já estava latente desde o final da guerra fria, mas que precisava de uma iniciativa deflagradora. A tradicional rivalidade entre Estados -- e principalmente entre as grandes potências --, mesmo sem deixar de existir, deverá se enfraquecer e dar lugar a um sistema de apoio interestatal e uma luta contra outras alternativas (contra as redes terroristas, em primeiro lugar, e também contra as máfias, o tráfico de drogas, determinadas organizações não governamentais que desestabilizam o poder dos Estados etc.).
A aceitação da Rússia como parceira do Ocidente -- ou talvez até como parte deste num futuro próximo -- é o exemplo mais significativo dessas mudanças. Isso foi favorecido pela perspicaz política externa de Vladimir Putin, que ao invés de se opor aos bombardeios norte-americanos sobre um país estrangeiro (posição tradicionalmente adotada por Moscou), colaborou com a coalisão liderada pelos Estados Unidos oferecendo assessoria (e até tropas) e pressionando as ex-Repúblicas soviéticas que fazem fronteira com o Afeganistão -- o Turcomenistão, o Tajiquistão e a Quirguízia -- a aceitarem o uso de seus territórios como bases de apoio nessa guerra. Com isso cessaram as críticas do Ocidente em relação aos massacres russos na Chechênia e esta república rebelde passou a ser vista pelos norte-americanos e pelos europeus não mais como uma vítima das atrocidades russas e sim como uma área onde há muitos fundamentalistas e grupos terroristas. E também algo que até há alguns meses parecia impossível de ocorrer, hoje tornou-se numa hipótese viável para os próximos anos ou no máximo para a próxima década: uma futura inserção da Rússia na OTAN (WINES, 2001). Somente depois de 10 anos do final do império socialista soviético, o Ocidente capitalista começa a eliminar a sua antiga desconfiança frente à Rússia e começa a ver esse Estado-nação como um membro de fato do sistema global e inclusive da Europa. Nesse sentido, o terrorismo no final das contas pode ter sido benéfico para os interesses econômicos e estratégicos russos.
Um outro provável ganhador dessas redefinições geopolíticas é a China. Ela também adotou um posicionamento de realpolitik, isto é, de perseguir os seus interesses específicos e esquecer o seu antigo discurso anti-capitalista e de "simpatia para com os oprimidos". Nesse sentido, ela procurou ganhar algo em troca de sua aceitação dos bombardeios sobre o Afeganistão e do seu apoio no combate aos grupos terroristas. Ela até aproveitou o momento para intensificar a repressão sobre os grupos islâmicos que existem na parte oeste do seu território, na região de Xinjiang. E o governo Bush começou a esquecer o seu discurso anterior, de considerar a China como o grande "competidor estratégico", e passou a vê-la como um parceiro na luta contra o terrorismo e os demais fatores de instabilidade do sistema global. Com isso fica mais fácil a assimilação da China na OMC e tendem a diminuir as críticas da mídia ocidental contra a brutal repressão promovida pelas tropas chinesas no Tibete e em outras áreas onde há etnias que almejam uma libertação nacional. Mas o grande sonho ou objetivo geoestratégico da China ainda está distante e, pelo menos até o presente, não foi incluído na pauta das negociações entre Washington e Pequim: a incorporação de Taiwan.
A ONU, paradoxalmente (pois afinal ela foi criada para evitar as guerras e não para lucrar com elas), deverá ser mais uma ganhadora com o desenrolar da luta contra o terrorismo. Os Estados Unidos em meados de setembro último de repente pagaram as suas dívidas para com essa organização internacional e solicitaram a sua intermediação no sentido de legitimar os bombardeiros contra o Afeganistão. Os estrategistas norte-americanos perceberam afinal que não podem dominar o mundo sozinhos, nem mesmo via OTAN, e que é necessário haver uma base legal de sustentação, um fórum internacional que legitime determinadas medidas duras, que ferem a soberania de inúmeros Estados, na luta contra o terrorismo. Além disso qualquer ação com o aval da ONU sempre será mais palatável para os demais povos do que uma outra decidida exclusivamente pelos Estados Unidos ou mesmo pela OTAN. E como todos os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU estão atualmente alinhados nessa luta contra o terrorismo, fica mais fácil usar essa organização internacional. Mas o preço ou a condição para isso é fortalecê-la, o que a longo prazo poderá ser uma faca de dois gumes na medida em que algumas resoluções lá aprovadas poderão não corresponder aos interesses norte-americanos.
Também a Europa deverá redefinir ao menos parcialmente a sua política de expansão e construção de um continente unificado. Como observou muito bem ASH (2001), existem na Europa cerca de 20 milhões de muçulmanos, portanto bem mais que nos Estados Unidos, e, além disso, o continente está praticamente cercado pelo mundo islâmico. Isso significa que a Europa deverá se empenhar muito mais no apaziguamento do descontentamento islâmico, talvez até encararando com mais seriedade as pretensões da Turquia de ingressar na União Européia e procurando se envolver com mais afinco nos conflitos ainda pendentes na região dos Balcãs. Mas o tema da segurança e do controle sobre as fronteiras, com vistas principalmente a selecionar quem entra no continente, deverá ocupar um privilegiado papel que não tinha antes deste episódio. Isso poderá retardar a expansão da União Européia. É bastante provável que primeiro ocorra uma expansão da OTAN para o leste e, só depois de muitos anos ou décadas, é que poderá ocorrer a incorporação na União Européia daqueles países não ocidentais ou não cristãos.
Quando aos prováveis perdedores desse episódio, a curto prazo evidentemente é o regime do Taleban no Afeganistão. Mas a longo prazo outros participantes do cenário mundial poderão sofrer algumas conseqüências da ação preventiva contra o terrorismo, em especial aqueles Estados que escondem terroristas e/ou permitem a existência de campos de treinamento terroristas no seu território. Eles deverão ser objeto de uma pressão muito maior -- e agora não apenas decidida pelos Estados Unidos e sim pela ONU --, que pode chegar desde a boicote econômico até a bombardeios localizados. E ao contrário do que ocorria até há pouco, eles não deverão mais contar com o apoio -- mesmo que indireto -- de países como a China ou a Rússia, cada vez mais afinados com o Ocidente, e talvez nem mesmo com os recursos financeiros oriundos da Arábia Saudita e de outras economias árabes exportadoras de petróleo, pois a pressão sobre elas será imensa e também haverá um maior controle sobre as transações bancárias internacionais. E provavelmente Israel deverá ser alvo de uma intensa pressão norte-americana e européia no sentido de negociar seriamente com a OLP e aceitar a existência de um Estado palestino autônomo. Isso inclusive já começou a ocorrer com as recentes declarações de Colin Powell a respeito da "falta de vontade" das autoridades israelenses em promover a paz na região. Mas o caso de Israel é complicado devido ao poderoso lobby judaico nos Estados Unidos e também em face de todo o seu poderio militar, inclusive a posse de armamentos nucleares. Além disso, os grupos radicais de ambos os lados, em especial os fundamentalistas islâmicos que fogem ao controle da OLP e promovem atentados nos momentos de negociações ou de trégua, dificultam sobremaneira a resolução da questão palestina. As pressões ocidentais para Israel ser mais transigente certamente ocorrerão, mas ainda não se sabe a intensidade delas -- que será maior no caso dessa guerra contra o terrorismo continuar gerando intabilidades na região e no globo e menor se a situação se acalmar em poucas semanas -- e nem se os radicais de ambos os lados deixarão que elas surtam algum efeito. Uma outra possível mudança é um golpe de Estado com a troca do governo -- ou talvez até o final da monarquia -- na Arábia Saudita. A família real saudita encontra-se bastante enfraquecida e pressionada por dois lados fortes: pelos fundamentalistas islâmicos, que a vêm como demasiadamente atrelada aos interesses ocidentais; e pelas autoridades norte-americanas, que pensam que esse governo saudita é ambíguo e pouco confiável, pois, como assinalou LUTTWAK (2001), uma boa parte do financiamento do terrorismo islâmico sai de contas bancárias localizadas nesse país árabe e as investigações sobre ataques terroristas anteriores -- contra as Khobar Towers, no litoral saudita, em 1996, e contra o US Cole, no Iêmem, em 2000 -- sempre apontaram para grupos radicados ou com fortes conexões na Arábia Saudita, sendo que o governo deste país recusou-se a colaborar com essas investigações.
Finalmente, uma série de medidas deverão ser adotadas com vistas a uma maior prevenção do terrorismo e, infelizmente, muitas delas poderão restringir o direito de privacidade e as liberdades individuais. Desde um maior controle sobre aeroportos e alfândegas até uma maior vigilância sobre as transações financeiras internacionais, passando por novas medidas de segurança nos aviões (portas blindadas que vedem o acesso dos passageiros à cabina de comando, mecanismos que impossibilitem o desligamento das comunicações com as torres de controle etc.), deverão ser operacionalizadas nos próximos anos. Também a internet e as telecomunicações internacionais deverão ser objeto de novas medidas de vigilância (novos sistemas de escuta, novos softwares para detectar certas palavras chave, etc.), assim como os laboratórios e centros de pesquisas em física nuclear e em microbiologia. Isso sem contar as maiores pressões internacionais, agora com o aval da ONU, sobre os Estados que escondem terroristas e/ou sediam os seus campos de treinamento. Tudo isso, é lamentável dizer, deverá contar com o apoio de grande parte da opinião pública, em especial aquela dos países desenvolvidos, que sofreu uma espécie de paranóia com esta crise e apoia todo um clamor por mais segurança. Mas no final das contas o terrorismo não vai cessar -- no máximo poderá ser mais controlado e reduzido --, pois ele é indissociável deste novo mundo globalizado com as permanências das inúmeras diversidades sócio-econômicas e alteridades culturais (as quais, é bom ressaltar, são positivas e não deploráveis) e com todo um avanço tecnológico que por um lado melhora a qualidade de vida de muitos e, por outro lado, possibilita a outros tantos o acesso a novos e mais sofisticados meios de destruição.

4. O episódio e as suas leituras

Os atentados de 11 de setembro e os bombardeios ao Afeganistão deram origem a inúmeros artigos, reportagens e entrevistas veiculados pela mídia. Alguns poucos são de excelente qualidade, porém, a maioria tão somente reproduziu determinados estereótipos que via de regra pouco elucidam a questão e tão somente refletem determinados valores de quem os profere. Uma boa parcela deles é maniqueísta: ao invés de procurar analisar os diversos aspectos (ou pelo menos algum deles) da problemática, eles imediatamente assumem um lado (visto como o "correto" ou o "bem") e passam a desancar o outro lado (o "incorreto"). Muitos afirmaram reiteradamente que os atentados seriam uma decorrência das desigualdades internacionais ou do capitalismo globalizado. Outros proclamaram que o seu significado estaria numa "vingança dos excluídos" da globalização ou do império norte-americano. Alguns ainda, uma minoria de evangélicos, os exorcizaram como uma decorrência do "excesso de liberdade" e dos exageros das conquistas feministas, homossexuais e de outras minorias. Também se enxergou nesse episódio mais um capítulo do "choque de civilizações", com o islamismo enfrentando à sua maneira o Ocidente. E um professor de estratégia e política internacional chegou a proclamar, numa entrevista televisiva, que eles foram uma consequência da "nova política isolacionista de Washington", na qual os Estados Unidos teriam deixado de atuar como uma superpotência na resolução dos problemas mundiais e inclusive teriam "diminuído os gastos militares". E, por fim, muitos dos que comemoraram, discreta ou ruidosamente, os ataques kamikazes que vitimaram milhares de pessoas e levaram à destruição de edifícios simbólicos, argumentaram que eles foram suscitados pela "arrogância" da política externa estadunidense, mencionando a falta de interesse dessa grande potência mundial em "resolver" os problemas planetários do meio ambiente, das desigualdades, das epidemias e da fome, das inúmeras guerras etc.
Alguns desses posicionamentos são tão absurdos que nem vale a pena refutá-los. Outros são equivocados pelo seu exagero. Examinemos, em primeiro lugar, a idéia de que esta guerra seria, em última instância, um "choque de civilizações". O próprio autor dessa polêmica tese segundo a qual os principais conflitos da nova ordem mundial são culturais -- idéia que já dissecamos num escrito anterior (VESENTINI, 2000) --, numa entrevista sobre o assunto, afirmou que "Claramente, Osama Bin Laden deseja que seja um choque de civilizações entre o Islã e o Ocidente. A principal prioridade do nosso governo é tentar impedir que se transforme em um" (HUNTINGTON, 2001). Ou seja, os acontecimentos não são "fechados", não estão completamente determinados a priori, mas são "abertos" ou relativamente indeterminados no sentido de se redefinirem constantemente, de adquirirem novas nuances dependendo do entrecruzamento das ações de cada participante. Seria uma completa vitória de Bin Laden e dos extremistas islâmicos se eles conseguissem transformar esses atos terroristas numa "guerra santa" e, conseqüentemente, a reação norte-americana numa "cruel retalização contra o Islã". Mas essa versão, ao que tudo indica -- principalmente pelo repúdio de inúmeras autoridades políticas e religiosas do mundo islâmico, que afirmaram que o terrorismo é algo inaceitável pelo Alcorão --, não vai prevalecer. E toda a diplomacia dos EUA (depois que as primeiras reações de Bush foram corrigidas pelos seus assessores, que inclusive promoveram uma visita dele a uma mesquita em Washington), e também de seus aliados (a começar por Tony Blair), foi planejada com vistas a isolar os fundamentalistas e estreitar os laços com as lideranças islâmicas moderadas. Assim, a idéia que começa a vingar, e que deverá prevalecer no final das contas, é a que esta é uma "luta contra o terrorismo", promovida não apenas pelo Ocidente mas pelos Estados em geral -- inclusive a maioria dos islâmicos --, em especial por aqueles mais comprometidos ou mais ativos na construção de uma ordem internacional menos instável e na qual os negócios possam prosseguir e até se expandir.
Vejamos agora determinadas opiniões simplistas, que foram bastante divulgadas nos últimos dias, a respeito da "impossibilidade de se vencer essa guerra no Afeganistão". Algumas delas foram propagadas por pessoas que se intitulam "especialistas" em estratégia ou em geopolítica. Conforme já demonstrou de forma pertinente RADU (2001), são improcedentes e até míticos os argumentos do tipo "o terreno impossibilita o uso de tecnologia avançada" ou que "tal como nos exemplos britânico (1838-42) e soviético (1979-89)", ou "tal como na guerra do Vietnã", os norte-americanos "certamente sairão derrotados desse país aguerrido e com uma natureza hostil". Sobre isso cabe apenas lembrar uma lição elementar sobre a guerra, que foi reproduzida tanto por Sun Tzu quanto por Clausewitz: ela é antes de tudo um choque entre vontades, entre sociedades diferenciadas, o que significa que a coesão social normalmente é mais importante para a vitória a longo prazo do que os combates no front. Não foram os terrenos (as montanhas, num caso, e as florestas tropicais, no outro), e nem mesmo um "maior conhecimento do terreno" pelos nativos, o que determinou as derrotas da ex-União Soviética, no Afeganistão, e dos Estados Unidos, no Vietnã. Foi a coesão social desses países na luta contra o invasor -- algo que não existe hoje no Afeganistão, onde, pelo contrário, a imensa maioria da população gostaria de se livrar do Taleban --, isto é, todo um extenso apoio e suporte popular aos guerrilheiros. E também o auxílio militar -- armamentos, treinamento, assessoria -- fornecido pela outra superpotência da época (pelos soviéticos aos vietnimitas e pelos norte-americanos aos guerrilheiros afegãos, inclusive ao Taleban) foi fundamental no desfecho dessas duas guerras. É por isso que a grande chance de vitória do El Quaeda ou do Taleban nesta guerra não está no relevo montanhoso, nem mesmo nos armamentos ou nas milhares de minas encravadas no solo afegão, mas sim na propaganda via mídia. O principal front -- se é que podemos usar aqui este conceito militar -- desta guerra, não se iludam, não está no território afegão e sim na mídia internacional, em parte na opinião pública das nações desenvolvidas internacional e de outra parte na consciência das populações islâmicas. Só um temor generalizado de revoltas populares em países islâmicos, algo tão forte que pudesse desestabilizar os regimes políticos atualmente vigentes nesses Estados, especialmente naqueles produtores de petróleo ou naquele que detêm armas nucleares (Paquistão), é que poderia levar os Estados Unidos e seus aliados a transigir, a cessar os bombardeios sobre o Afeganistão e inclusive realizar inúmeras outras concessões (maiores pressões sobre Israel com vistas a criar um Estado palestino independente e talvez até o desmantelamento da base militar norte-americana no território saudita). Provavelmente foi por esse motivo que nos últimos dias Bin Laden concentrou os seus esforços na tentativa de conceder várias entrevistas aos principais canais de televisão do Oriente Médio e dos EUA e, segundo alguns jornais, ele chegou a veicular a hipótese de se entregar desde que seja para um país "neutro" e onde ele possa ter um julgamento "isento" (isto é, podendo falar à vontade e assim prosseguir com o seu combate via mídia). E também é por esse motivo que a principal frente desta "guerra contra o terrorismo" por parte dos Estados Unidos e de seus aliados não se encontra no Afeganistão -- esta é apenas uma frente provisória -- e sim em primeiro lugar na consciência das populações muçulmanas, procurando tornar vitoriosa a idéia de que "esta não é uma guerra contra a religião ou a civilização islâmica", e, em segundo lugar na opinião pública e nas organizações internacionais, procurando legitimar e operacionalizar novas medidas de proteção (das fronteiras, dos aeroportos e aviões, dos edifícios símbolo etc.) e de vigilância (sobre contas bancárias, sobre laboratórios que manipulam bactérias ou virus, sobre determinadas instalações químicas ou laboratórios de física nuclear, sobre "atividades suspeitas" de alguns indivíduos ou grupos etc.).
E, por fim, existem aqueles, que por algum dos motivos apontados acima, festejaram os atos terroristas e torcem para uma derrota norte-americana e uma vitória do Taleban no Afeganistão (além de exultarem com os protestos populares contra seus governos e contra o Ocidente, promovidos por religiosos fundamentalistas, no Paquistão e na Indonésia). Cabe apenas indagar se eles são movidos pela razão ou por um ódio irracional e até mesmo fascista. Pois por mais que o capitalismo globalizado e os Estados Unidos tenham promovido ou sido coniventes com determinadas desigualdades e injustiças, a alternativa oferecida por esses grupos extremistas é muito pior. É uma completa destruição da frágil democracia -- que, apesar de incompleta, deve ser preservada e inclusive expandida (e não combatida) -- e um predomínio da intransigência, de uma rígida hierarquia que não admite contestações e de um caminho único que não aceita a pluralidade ou sequer o diálogo com o(s) outros(s). Basta lembrar dos massacres e das severas proibições promovidos pelo Taleban -- fuzilamento de pessoas sem julgamento, interdição de qualquer música ou arte que não seja islâmica, fechamento de todos os cinemas, canais de televisão e jornais independentes etc. --, da destruição das estátuas gigantes de Buda (um rico patrimônio histórico-cultural do Afeganistão) e da incapacidade desse regime em gerenciar minimamente a economia e alimentar a população (a maior parte dos alimentos que a população afegã consumiu nestes últimos anos veio da ajuda humanitária promoviada pelas organizações internacionais). Basta lembrar ainda do ódio intenso que todos esses militantes fudamentalistas -- e não apenas o Taleban ou o El Quaeda -- alimentam contra as conquistas (mesmo que ainda incompletas) feministas no Ocidente, contra alguns direitos mínimos concedidos aos homossexuais, contra a liberdade de expressão, contra a idéia de um sistema judiciário independente, contra as eleições e a rotatividade dos partidos no poder, enfim contra toda uma filosofia de direitos dos homens e dos cidadãos, que é a base da democracia. Esse tipo de posicionamento -- a identificação com os terroristas porque eles atacaram o "centro do imperialismo" -- lembra muito aquela imagem, sugerida por Hannah Arendt num escrito sobre a "crise da educação", a de uma criança serrando o galho da árvore sobre o qual está sentada. Ele se assemelha ainda ao equívoco cometido por alguns na Alemanha da década de 1920 e inícios dos anos 30, que detestavam (com alguma razão) a República de Weimar e manifestavam uma certa complacência ou até alegria frente à baderna e aos atos violentos promovidos pelo partido nacional-socialista de Hitler. O resultado é conhecido por todos. Convem aqui recordar a lição de que nem sempre o inimigo do meu adversário é meu amigo. Muitas vezes ele é pior ainda que o adversário, em especial quando não respeita as regras do jogo democrático, quando semeia o pânico, o terror e a intolerância, quando nos considera a todos infiéis que têm que ser convertidos pela força.

Nenhum comentário:

Postar um comentário