A proposta do presente artigo associada ao desvendamento das relações que articulam atores públicos e privados, para a tomada da decisão política para a realização de jogos esportivos, particularmente da Copa do Mundo e das Olimpíadas, que deverão ser realizados em 2014 e 2016 – no contexto de uma sociedade globalizada que transforma a política urbana local em benefício dos interesses econômicos e políticos associados ao processo de globalização. As políticas urbanas locais são estratégicas para o processo de globalização. Os resultados da pesquisa revelam que podemos observar a formação de uma rede de corporações dedicadas ao desenvolvimento de grandes eventos que associam o poder econômico ao político, para produzir atividades imateriais de forte conotação simbólica.
Como, por que e para quem são produzidas as políticas urbanas para os jogos esportivos globais na cidade do Rio de Janeiro?
Quando
o governo Cesar Maia propôs a primeira candidatura da cidade do Rio de
Janeiro para as Olimpíadas, em 1992, fui assistir ao seu lançamento em
Copacabana. Havia sido organizada uma comemoração de ampla participação
popular, e quando lá cheguei, pude observar caminhões ao longo da orla
distribuindo balões de gás. Ao mesmo tempo, era possível perceber a
lentidão do processo pelas filas de muitas crianças que se formavam ao
lado dos caminhões. Ao meio-dia em ponto, os balões foram soltos e
tomaram os céus de Copacabana. Daí eu pensei: esta será a imagem síntese
da solidariedade carioca para a realização dos Jogos Olímpicos. Foi
assim que pude ler a primeira imagem do Rio para os Jogos Olímpicos. À
noite as televisões do Brasil transmitiam para o mundo a imagem de uma
solidariedade que não encontrava referente na realidade.
A
proposta do presente artigo associada ao desvendamento das relações que
articulam atores públicos e privados, para a tomada da decisão política
para a realização de jogos esportivos, particularmente da Copa do Mundo
e das Olimpíadas, que deverão ser realizados em 2014 e 2016 – no
contexto de uma sociedade globalizada que transforma a política urbana
local em benefício dos interesses econômicos e políticos associados ao
processo de globalização.
As políticas
urbanas locais são estratégicas para o processo de globalização. Para
participar da rede de cidades globais, o governo do Rio de Janeiro
passou a realizar projetos de intervenção capazes de colocar a nossa
cidade na competitividade do sistema global. O que podemos observar é a
formação de uma rede de corporações dedicadas ao desenvolvimento de
grandes eventos que associam o poder econômico ao político, para
produzir atividades imateriais de forte conotação simbólica.
Essas redes
associam corporações globais, governos locais, agências de
entretenimento, empresas aéreas e de segurança, escritórios de
arquitetura, capital imobiliário, organizações sociais e tantos outros e
atuam em beneficio de interesses de cada um dos membros e de todos ao
mesmo tempo. Existe uma infinidade de atores que participam desse
processo, o qual promove uma ampla articulação que beneficia atores
locais e globais.
O nosso desafio é
ler e compreender um conjunto de estratégias dos atores que ampliam a
mobilidade de pessoas em torno de territórios globais e em busca da
satisfação de um desejo de consumo de bens imateriais, associados ao
entretenimento e à satisfação simbólica. Daí a importância do turismo
internacional, que move milhões de pessoas do mundo e produz ganhos
econômicos inimagináveis. Para alavancar essa mobilidade, são realizados
grandes eventos, que podem ser culturais – como esporte, música,
festivais de cinema – e acadêmicos – como congressos científicos – que
fazem a estrutura móvel da globalização.
Para alcançar o seu sonho de fazer do Rio de Janeiro um território global, Cesar Maia apresenta a cidade como candidata para sediar os Jogos Pan-americanos –
proposta vencedora na reunião da Organização Desportiva Pan-americana
(ODEPA). Durante o seu segundo governo, entre 2004 e 2008, a política
urbana concentrou-se na produção de um cenário para abrigar os jogos
Pan-americanos. E, para isso, foi concebido um megaprojeto de
intervenção na cidade do Rio de Janeiro, o qual ia desde a redefinição
do sistema de transporte, da construção da Vila do Pan, de Estádios e da
cidade da Música, até a renovação da Orla, do aeroporto de Jacarepaguá e
do Riocentro. Para tanto, é valorizada a
produção de uma imagem de grandiosidade associada aos corpos e jogos,
visando atrair uma multidão de turistas para participar da grande festa
esportiva.
Nesse complexo
projeto, a mais importante ação foi a construção de uma vila olímpica –
um conjunto habitacional – para abrigar os cinco mil atletas que
participaram das competições. Foram construídos ainda quatorze prédios,
com 1.400 unidades habitacionais, além de um conjunto de equipamentos de
lazer associados ao projeto. Tudo isso sem falar ainda da Cidade da
Música – projeto do arquiteto global Chistian de Portzamparc – onde
estão localizadas duas salas de concertos: uma para 1.800 espectadores e
a outra para 800; e uma sala de música de câmara para 500 pessoas, além
de outros espaços para atividades musicais. A obra, iniciada em 2002,
pode custar, no fim das contas, cerca de R$ 670 milhões, dos quais R$
431 milhões já foram pagos pelos cofres públicos.
A realização dos jogos pan-americanos teve um custo extremamente elevado: a previsão inicial foi de R$ 691.013.912,00; hoje, esse
valor subiu para cerca de R$ 4 bilhões. O custo médio das quatro edições
anteriores (Santo Domingo, Winnipeg, Mar Del Plata e Havana) ficou
muito abaixo disso: cerca de R$ 280 milhões cada. Em outras palavras, o
Brasil está gastando quatorze vezes mais para produzir o mesmo evento,
sendo que a maior parte desse dinheiro – cerca de 90% – vem dos cofres
públicos.
De que forma esse projeto transforma as condições da existência social na cidade do Rio de Janeiro?
O
legado dos Jogos Pan-americanos é um bom exemplo para se compreender a
lógica da política. Da Cidade dos Esportes ao Complexo Esportivo João
Havelange, do Parque Aquático Maria Lenk ao Velódromo, é possível
observar o abandono dos equipamentos. Como sua conservação é muito
onerosa, a prefeitura não consegue arcar com os altos custos de sua
manutenção e delega a clubes privados, capitais privados e até políticos
a prerrogativa de sua apropriação.
Mas
o mais grave é o que aconteceu com a Vila do Pan que, antes mesmo de
sua inauguração, já sofria problemas de estrutura – um trecho de 400 metros
já havia ruído –, que eram mascarados pela mídia. O fato é que
engenheiros do Conselho Regional de Arquitetura e Engenharia do Estado
do Rio de Janeiro (CREA) respondem tecnicamente e revelam que a fundação
da obra não foi realizada adequadamente, sobretudo por se tratar de
terreno arenoso em localidade próxima a rios, o que colocou a
obra em estado de risco. Sem o habite-se, os proprietários estão
impedidos habitar nos apartamentos adquiridos a preço de ouro no mercado
imobiliário.
É doloroso observar
como atualmente a Cidade da Música está totalmente abandonada e
frequentada apenas por seguranças e alguns engenheiros, e a visitação
pública só é permitida com autorização da prefeitura – resultado de
sonhos faraônicos de governantes que produzem grandes projetos de
justiça social duvidosa.
Isso nos revela como
essa estratégia responde por interesses alheios ao lugar, perpassa os
interesses do capital global e produz uma nova ordem nos processos de
exclusão social. É possível compreender como a produção do espaço
simbólico é efêmera. Depois da festa, a máscara cai, e pouco resta para a
realidade social das pessoas no mundo de verdade.
Atualmente está em
debate a realização da Copa do Mundo em 2014, quando os projetos
concentram-se na produção de uma infraestrutura de transportes capaz de
articular os territórios renovados para os jogos. No plano de obras
para a realização da Copa do Mundo de 2014, estão incluídas 59 obras,
das quais 12 são reformas de Estádios. O custo total previsto é de R$
17,52 bilhões, incluindo verbas federais, estaduais e privadas. A
questão principal estende-se entre sediar as atividades principais no
Centro ou na Barra, sendo que os projetos de arquitetura e urbanismo são
propostos quando são discutidos a sua localização, os custos econômicos
e os benefícios para a cidade e seus moradores.
O que podemos fazer para que não se repita o que aconteceu com os jogos Pan-americanos?
É
importante produzir um conhecimento orientador da formulação de
propostas alternativas de políticas urbanas, cujos objetivos sejam a
equidade econômica, a liberdade política e a justiça social nas cidades.
O exame da história da
resistência social na cidade do Rio de Janeiro atesta a importância da
organização social para pôr limites aos interesses escusos manifestos na
política urbana da globalização. Relembro o projeto de renovação da
Zona Portuária, anunciada por Cesar Maia em 2002, cujo objetivo era
substituir a área depauperada do Porto por um espaço de produção
econômica e de criação cultural para o desenvolvimento de atividades
globais. O projeto de renovação, centrado na construção de um museu
submerso ao mar – projetado pelo arquiteto de Bilbao, Jean Nouvelle –,
suscitou a organização da comunidade local, levando-a a participar do
debate e a ter um posicionamento político alternativo. Essa mobilização
real aglutinou um grande número de atores sociais e foi capaz de
produzir um discurso alternativo ao discurso dominante da globalização
em defesa dos interesses dos seus habitantes. E foi capaz de impor
limites aos interesses alheios, expressos no projeto de revitalização
proposto pela prefeitura, e uma liminar concedida pela justiça suspendeu
o contrato assinado entre a prefeitura do Rio e a Fundação Guggenheim.
Essa resistência social apresenta questões que permitem identificar os
procedimentos que conseguiram inibir um contrato milionário entre os
agentes do sistema global de cultura e os governantes de nossa cidade. Isso para responder à nossa indagação inicial: para que e para quem.
Esse é
o modelo que nos conduz a pensar na importância da ação social na
formação de uma rede capaz de dizer não aos interesses das redes globais
que conduzem a política urbana de hoje na cidade do Rio de Janeiro.
Trata-se de produzir um novo discurso, valorizado pela participação
social e pela formação de redes de agentes politicamente responsáveis,
capaz de multiplicar a formação de coletivos contra os interesses
hegemônicos da globalização.
A
proposta alternativa aqui apresentada tem esse objetivo: criar uma rede
capaz de produzir um espaço de interlocução pública para ganhar a coesão
social em torno de um discurso alternativo o qual permita o exercício
de uma ação consensual e coletiva. E dizer não aos interesses de atores
alheios às condições de existência social no Rio de Janeiro.
Obs : Estão sendo fechadas varias cabines de polícia que nos custaram os olhos da nossa cara , há menos segurança nas ruas , os upas da vida cada vez com menos médicos e cada vez mais cheias , nossos hospitais nem se fala , foi tão legal ver o povo brasileiro fazendo manifestação , confesso que fiquei meio assustado mas acreditei que ia mudar alguma coisa , mas agora sei que o povo brasileiro é burro ele sabe que tem força mas não sabe como usar ou usa força sem saber pra que tá fazendo .
Por ultimo
MoradiaNada menos do que 3 mil famílias residentes na cidade do Rio de Janeiro já foram removidas por conta da realização de projetos direta ou indiretamente ligados à Copa do Mundo e às Olimpíadas. O número pode chegar a quase 11 mil famílias expulsas, já que outras 7.800 famílias correm o risco de despejo. Em relação ao primeiro dossiê, nessa segunda versão foram reunidas informações mais específicas e atualizadas de modo a demonstrar detalhadamente as violações de direitos humanos ocorridas na cidade.
As comunidades envolvidas no processo de remoção foram divididas em quatro eixos específicos relacionados ao fator de risco: as obras viárias em curso no Rio de Janeiro; as obras de instalação e reforma de equipamentos esportivos; as obras de revitalização turística da zona portuária e as áreas de risco ou interesse ambiental.
Apesar da especificidade e das peculiaridades de cada região, o dossiê aponta padrões no trato do poder público, sobretudo o municipal, com as comunidades que se vêem envolvidas no contexto de remoção. Esses são seis, presentes na ação do poder público no trato com as comunidades atingidas, segundo o comitê:
“(i) Completa ausência, ou precariedade de informação para as comunidades, acompanhada de procedimentos de pressão e coação, forçando os moradores a aceitarem as ofertas da prefeitura do Rio. Cabe frisar que as comunidades visitadas, sem exceção, não tivera acesso aos projetos de urbanização em suas áreas de moradia.
(ii) Completa ausência, ou precariedade de envolvimento das comunidades na discussão dos projetos de reurbanização promovidos pela prefeitura, bem como das possíveis alternativas para os casos onde são indicadas remoções.
(iii) As indenizações oferecidas são incapazes de garantir o acesso a outro imóvel situado na vizinhança próxima, tendo em vista que a prefeitura só indeniza o valor das benfeitorias e não a posse da terra, fato em geral agravado pela valorização imobiliária decorrente dos investimentos realizados pelo poder público. Tal situação não é revertida nem mesmo com o instrumento da compra assistida, o que gera um aumento no valor pago pelas indenizações em torno de 40%., mesmo assim insuficiente para a aquisição de um imóvel na mesma localidade. Resta a opção de transferência para um imóvel distante, nos conjuntos habitacionais que estão sendo construídos em geral na zona oeste, no âmbito do programa Minha Casa Minha Vida.
(iv) Deslegitimação das organizações comunitárias com agentes dos processos de negociação, sempre individualizados por famílias, buscando enfraquecer a capacidade de negociação dos atingidos com o poder público.
(v) Desrespeito à cidadania através de ameaças, pressão e coação.
(vi) Utilização da Justiça como ferramenta contra o cidadão. Nas ações judiciais promovidas pela procuradoria do município, o poder público tem sido “uma máquina irresponsável de despejos”, sem compromisso com a saúde e a vida das pessoas. “A prática da procuradoria do município parece ser a de castigar todos os cidadãos que recorrem à justiça para proteger os seus direitos.”
Uma comunidade que passou por um processo emblemático de remoção foi a Comunidade do Campinho. Segundo o Comitê, o primeiro contato da administração municipal com os moradores foi em janeiro de 2011. Cinco meses depois a comunidade já estava extinta. O motivo? A construção de um mergulhão do corredor Transcarioca de BRT. O dossiê afirma que houve pressão psicológica para que os moradores aceitassem um apartamento do Minha Casa Minha Vida em Cosmos, a 60 km do local. “Há relatos, com mais de uma testemunha, do recebimento de indenizações em sacos de dinheiro pagos em negociação direta com a empreiteira responsável pela obra”, diz o dossiê.
Mobilidade urbana para quem? É essa pergunta que faz o dossiê ao tratar das intervenções de mobilidade urbana que estão em curso por conta dos megaeventos no Rio de Janeiro. “A análise dos investimentos na cidade do Rio de Janeiro indica que estes não estão voltados para o atendimento das áreas mais necessitadas e que apresentam os piores indicadores de mobilidade. Pior do que uma infraestrutura mal construída ou mal distribuída pelo território da cidade, constata-se que muitas comunidades têm sido removidas compulsoriamente ou sofrido ameaça de remoções por conta da construção da infraestrutura de transporte para Copa e Olimpíadas. Isto, por si só, constitui uma violação ao direito à moradia garantido em diversos tratados internacionais”, afirma.
Ou seja, além dos investimentos em mobilidade urbana beneficiarem as áreas que já contam com as melhores alternativas nesse aspecto, a população carente tem que lidar com o ônus das remoções.
“Através das propagandas oficiais e da mídia em geral, o poder público tem prometido uma ‘revolução nos transportes’, construindo as vias Transcarioca, Transolímpica e Transoeste (todas BRTs), e o metrô Lagoa-Barra (alongamento da linha 1) – todos ligados à realização da Copa e dos Jogos olímpicos. Por outro lado, a população clama por serviços de transporte de massa em outras direções e para outras regiões da cidade. Ou seja, enquanto hoje o serviço de transporte coletivo oferecido à população se configura como caro, precário e insuficiente para a demanda existente, o cenário que se desenha para o futuro é o de investimentos em transporte que, ao invés de atenderem à demanda existente, tornam possível a ocupação de áreas vazias ou pouco densas, visando e promovendo a valorização imobiliária e a expansão irracional da malha urbana”, analisa o documento do Comitê Popular. O dossiê também aponta para uma forte concentração dos investimentos na cidade do Rio de Janeiro, em detrimento das outras 20 cidades que compõe a área metropolitana da capital; dentro da capital, os investimentos estão maciçamente direcionados à Barra da Tijuca e à zona sul, as áreas mais nobres do Rio.
Destaca-se também os constantes aumentos das tarifas de transporte.
Trabalho Tido como um dos grandes fatores legitimadores da realização dos megaeventos, o impacto da Copa e das Olimpíadas no trabalho é analisado pelo dossiê do Comitê Popular.
O primeiro aspecto apontado pelo comitê é que nas obras ligadas aos megaeventos é comum ocorrer a chamada precarização do trabalho. Prazos exíguos, omissão de fiscalização pelos órgãos públicos competentes, o contexto de exceção que permite licitações feitas a toque de caixa, além das pressões exercidas por órgãos como o COI e a FIFA ajudam a criar este cenário. Só o Maracanã, aponta o dossiê, já passou por duas paralisações relacionadas a condições de trabalho.
A repressão ao comércio informal também se agravou no contexto dos megaeventos, afirma o Comitê. Segundo documento da Streetnet International, articulação de coletivos de vendedores informais de todo o planeta, há 60 mil vendedores ambulantes trabalhando no Rio de Janeiro em risco por conta da realização dos jogos. Os ambulantes não poderão se beneficiar do contexto da Copa e das Olimpíadas, uma vez que estão proibidos de trabalharem próximos aos locais vinculados às competições. “Também está prevista a repressão, com prisão e apreensão de mercadorias, de qualquer pessoa que comercialize material que faça referência aos símbolos dos eventos e de seus patrocinadores. Nessa mesma direção, está proibida a venda de qualquer souvenir dos eventos aos turistas produzido pelos trabalhadores informais. Ou seja, só poderão vender mercadorias com símbolos dos eventos as empresas licenciadas pela FIFA e pelo COI”, diz o texto. Isto está inclusive garantido pelo artigo 11 da Lei Geral da Copa (12.663/2012).
Esporte“O futebol no Brasil está vivendo um momento bastante complicado. Os estádios históricos estão sendo destruídos para renascer em forma de centros de consumo e turismo, por vezes com jeito de shopping-center. Os ingressos dos campeonatos nacionais e estaduais estão cada vez mais caros, fora do alcance do torcedor ‘tradicional’. A média de público nos estádios está em plena queda”, analisa o dossiê do Comitê Popular.
A concessão do Maracanã, com a consequente demolição de praças esportivas essenciais como o Parque Aquático Júlio Delamare, o Estádio de Atletismo Célio de Barros e a consolidação do projeto olímpico na Barra da Tijuca são os principais fatores contestados pelo dossiê.
A chamada elitização do público do futebol também é destacada pelo dossiê. “Percebe-se um decréscimo de 732.160 torcedores nos estádios da primeira divisão do campeonato brasileiro de futebol, entre 2011 e 2012, o que representa uma queda de 13%. Ao mesmo tempo, os custos dos ingressos subiram 9% e a arrecadação geral aumentou em 3%. Esses números podem indicar que menos brasileiros têm acesso aos estádios. Isso pode estar ocorrendo em função das obras, em andamento nos grandes estádios visando a Copa do mundo nas principais cidades do país, como é o caso do Rio de Janeiro”, aponta o documento.
Segundo o Dossiê, é possível analisar esse contexto como o de imposição de um modelo de futebol empresarial. Nele “estimula-se a venda do espetáculo aos ‘clientes’, que vão aos estádios para ter uma experiência de entrenimento e não uma participação ativa, identitária e afetiva com o evento. Sem dúvida, os números indicam que os que frequentam os estádios desembolsam cada vez mais dinheiro”.
Além disto, destaca-se também a destruição do legado do Pan-2007 pelo projeto das Olimpíadas de 2016 como ocorreu com o Velódromo, o Parque Aquático Maria Lenk e, mais recentemente, o estádio do Engenhão.
Meio ambienteO documento aponta que, apesar do discurso oficial afirmar veementemente a preocupação ambiental, na prática ocorre o inverso. A construção dos corredores viários Transcarioca, Transolímpica e Transoeste são alguns exemplos.
No caso do primeiro projeto, por exemplo, o dossiê critica o aterramento da lagoa de Jacarepaguá. Estavam previstos, para mitigar o efeito do aterramento, dois programas pelo estado do Rio: o Programa de Monitoramento da Fauna Existente e o Programa de Compensação Ambiental. Nenhum deles foi realizado.
Segurança pública“No Rio de Janeiro, que vem servindo de laboratório no tema da segurança pública, defende-se a necessidade de medidas extraordinárias de segurança. Mas cabe perguntar o que está sendo segurado, como, onde, e quais serão os efeitos de curto, médio e largo prazo das medidas que estão sendo adotadas”, pontua o dossiê.
Os fatos de a segurança durante os jogos ser feita por agentes privados contratados pela FIFA, bancados com dinheiro público, de o governo brasileiro pretender investir R$ 80 milhões em câmeras de vigilância nos estádios e não haver garantias de que as imagens coletadas pela FIFA sejam apagadas depois do evento, são criticados. O dossiê também vê essas ações como pretexto para aprofundar a mudança do modelo de segurança pública para o predomínio da segurança privada.
“Como um experimento para controlar as massas e extirpar ameaças, os megaeventos deixarão um saber governamental sobre as novas configurações da cidade. Esse saber não é neutro ou despolitizado, mas contextualizado dentro de um complexo cultural que identifica ameaças particulares que são socialmente construídas. A montagem do aparelho para proteger os interesses associados aos megaeventos pode ser adotada e utilizada para proteger os mesmos interesses pós-evento”, afirma o Comitê.
Informação e participaçãoO Comitê destaca ainda a negligência com respeito ao direito à informação e participação popular nos assuntos de interesse público durante os preparativos da Copa. Como exemplo, cita as remoções ocorridas nas comunidades Vila Harmonia, Recreio II, Restinga, Sambódromo, Campinho e Metrô-Mangueira. Todas as comunidades foram avisadas das remoções de suas casas algumas horas antes do despejo. E diz que não houve apresentação de justificativas plausíveis em grande parte das remoções nem os detalhes dos projetos foram publicados.
No aspecto orçamentário aponta também falta de transparência. “A divulgação de aumento de gastos frequentemente ocorre muito tempo após ter sido efetuado e, mesmo assim, nem todos os valores são publicados. No caso da preparação para os Jogos Olímpicos, há apenas uma estimativa inicial de orçamento constando no dossiê de candidatura, mas os gastos poderiam efetivamente alcançar quase o dobro dessa estimativa, segundo depoimento do presidente da Autoridade Pública Olímpica, em 2012.”
Orçamentos e finançasO dossiê chama atenção para o valor total de investimentos para a realização da Copa do Mundo no Rio de Janeiro, que já sofreu um aumento de 95% tendo como base os valores da Matriz de Responsabilidades. Os R$ 2,2 bilhões previstos inicialmente tornaram-se quase R$ 4,2 bilhões. E contesta a informação de que os Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio de Janeiro em 2016 custarão cerca de US$ 12,5 milhões, elencando 21 projetos municipais ligados, ao menos no discurso, às Olimpíadas cuja soma de orçamento alcança nada menos do que R$ 22,6 bilhões.
“Chama atenção o fato das decisões relativas a esses investimentos não passarem por uma ampla discussão democrática, envolvendo todos os segmentos sociais, colocando em pauta o projeto de cidade que está construído”, conclui o documento, criticando, mais uma vez, a concentração de investimento público em áreas nobres.